Mudança

Nos grandes momentos todos são heróis; tem-se sempre a ideia, embora vaga, de que se está representando e que o papel se deverá desempenhar com perfeição; de outro modo não aplaude o público.

11 de janeiro de 2011

Enquanto Portugal teve homens de «havemos de fazer» não tivemos liberdade, não tivemos reino, não tivemos coroa...

Tanto prevalecem na nossa pátria os rumores contra a verdade, e as invenções ou suspeitas de poucos, contra o conhecimento e experiência de todos.

Não é condição de homens, e muito menos de portugueses, haver pessoa, e mais em tamanhos lugares, de quem todos e em tudo digam bem.

Eu sempre creio que as línguas estrangeiras saberão melhor avaliar as circunstâncias de tamanho sucesso, porque as nossas sempre são curtas em louvar, podendo mais a inveja dos particulares que o amor comum da pátria.

Dizem que temos valor, mas que nos falta dinheiro e união; e todos nos prognosticam os fados que naturalmente se seguem destas infelizes premissas.

Nós (portugueses) temos a nossa desunião, a nossa inveja, a nossa presunção, o nosso descuido e a nossa perpétua atenção ao particular.

Os inimigos que mais temo a Portugal são soberba e ingratidão, vícios tão naturais da próspera fortuna que, como filhos da víbora, juntamente nascem dela e a corrompem.

Todos os que na matéria de Portugal se governaram pelo discurso, erraram e se perderam.

Em nenhuma parte tanto como em Portugal se gasta tanto papel, ou se gasta tanto em papéis.

Mais temo eu a Portugal os perigos da opulência, que os danos da necessidade.

Enquanto Portugal teve homens de «havemos de fazer» (que sempre os teve) não tivemos liberdade, não tivemos reino, não tivemos coroa. Mas tanto que tivemos homens de «quid facimus» (que fazemos), logo tivemos tudo.

Padre António Vieira

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